Desculpe, você precisa ativar o javascript para visitar este website
Sala 10

Giulio Starace

(Nápoles, Itália, 1887 - Sao Paulo, SP, 1952)
Rubiácea Paulista, 1935
Doação de Carlos Júlio de Bayeux Starace, 1999
Foto: Isabella Matheus

SALA 10
SÃO PAULO:
CONTEMPLAÇÃO SUSPENSA

Transcrição

Você está na sala 10, que se chama São Paulo: Contemplação Suspensa. Aqui vemos exemplos das várias maneiras como a cidade de São Paulo foi representada ao longo do tempo. Também pela perspectiva do café. Te convido a observar comigo três obras desta sala e refletir sobre as diferenças entre elas. A primeira é a escultura de bronze que se chama Rubiácea Paulista e foi produzida em 1935. Seu autor, Giulio Starace, é um escultor nascido na Itália, que se mudou para o Brasil e aqui se dedicou a fazer desde esculturas pequenas para decorar espaços interiores até monumentos para lugares públicos.

Rubiácea Paulista representa uma mulher nua com braços envoltos por ramos de uma planta.

É dessa planta que vem o título da escultura: Rubiácea é o nome científico atribuído à espécie vegetal do café. Aqui, o artista imagina uma planta nascida em São Paulo, e que é naturalmente do estado. Desse modo, ele busca dar uma forma, quase originária, para a relação paulista com o café, que é o principal produto dessa economia. A escultura é aquilo que chamamos de alegoria. Uma forma que ganha força no século 17 e se torna muito comum nas academias de Belas Artes do século 19.

A Alegoria pode ser entendida como um modo como os artistas criam representações de conceitos e ideias abstratas. Geralmente, nas alegorias, essas ideias ganham forma humana e valores morais, que acabam emprestando sentimentos, emoções e humores a uma ideia. Por exemplo: quando a gente vê imagens da justiça como uma mulher cega, trata-se de uma alegoria. A justiça não é uma mulher, é uma ideia que ganha uma representação figurativa a partir do corpo de uma mulher. E cega, a fim de demonstrar sua imparcialidade.

Essa escultura que estamos vendo é um exemplo típico de alegoria. Na história da arte, frequentemente a mulher nua carrega consigo significados de pureza e naturalidade. A natureza, a primavera e a floresta comumente são relacionadas a atributos ditos femininos. Aqui, esses sentidos encontram sua representação no café, uma planta que é vista como originariamente paulista – que nasceu, brotou e prosperou em São Paulo. É fundamental perceber que essa representação idealizada de mulher é própria de uma época e, principalmente, fruto do olhar de um sistema comandado por homens. Nessa exposição, é possível ver mulheres representadas de outras formas e ocupando outros lugares. Por isso mesmo, agora vamos falar de outra obra, a pintura São Paulo, feita em 1924, por Tarsila do Amaral. São Paulo é uma das primeiras pinturas modernistas a serem adquiridas pela Pinacoteca, no final dos anos 20. Nela Tarsila do Amaral pinta a cidade a partir do Vale do Anhangabaú, seus jardins, o Viaduto do Chá e os prédios recentes de uma cidade que então começa a se verticalizar. Verticalização que é impulsionada pela economia cafeeira. Tarsila do Amaral tem sua história intimamente ligada à produção de café no Brasil. Filha de fazendeiros, cresceu no interior, em meio aos cafezais. Por isso, também frequenta uma elite econômica e política formada por grandes produtores de café. Quando Tarsila do Amaral pinta São Paulo em 1924, mescla uma representação modernista com características rurais. A forma de tratar os elementos da paisagem, aproximando-os da geometria, enfatizando o mundo como uma construção, é intimamente ligada ao cubismo, movimento desenvolvido na Europa e em outros lugares do mundo. Apesar de essa intenção cosmopolita, vemos transparecer uma atmosfera interiorana e pacata por entre as grandes estruturas de ferro, os trilhos e as torres. A experiência rural da artista aparece nos tons lavados da terra, na cidade ajardinada, quase bucólica. É uma São Paulo do progresso, em que a modernidade não se opõe ao campo, mas está vinculada ao trabalho e à vida nas fazendas. Como Tarsila do Amaral mesma disse:

“Agradeço por ter passado na fazenda a minha infância toda. As reminiscências desse tempo vão se tornando preciosas para mim. Quero, na arte, ser a caipirinha de São Bernardo, brincando com as bonecas de mato. Não pensem que essa tendência brasileira na arte é malvista. Pelo contrário. O que se quer aqui é que cada um traga contribuição de seu próprio país”.

Ainda nesta sala você pode ver Gigantes e Pigmeus, de 1934, do pintor paulistano Benedito José Tobias. Na tela, vemos outra face da expansão urbana: a demolição. Se na pintura de Tarsila do Amaral o progresso é exaltado em formas geométricas e grandiosas de uma arquitetura moderna, aqui, logo na década seguinte, vemos o passado ser destruído arbitrariamente para a construção do novo – apagando modos de vida mais antigos, junto com seu cotidiano, para instalar a novidade. Nesta sala, vimos como o café costura a história e transformação de São Paulo: ele é a riqueza que constrói a cidade e configura jeitos de olhar para sua modernização. Agora, vamos falar da relação da economia com a terra. Por isso, convido vocês a me acompanharem até a sala 11, chamada Conhecimento e Dominação.